segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A simples, incrível arte do sim

- Devir? Que é isso, mãe?
- Filha, devir é o oposto de ser, que é estático. Devir é tornar-se. E tudo que devém é novidade, filha. Como dizia Chico Buarque na música “Roda Viva”, como dizia Lulu Santos na música “Como uma onda”, como dizia o Tim Maia e mesmo muitos filósofos, antigos e modernos, a realidade é bailarina: sempre nos surpreende com passos novos e inesperados. É por isso que te pergunto, filha, pra quê se preocupar, sofrer com uma situação qualquer? Ela é necessariamente passageira!
- Mas mãe, se é assim, então, pra que se alegrar já que sabemos que também a alegria é passageira?
- Filha, repare as crianças brincando à beira-mar... Elas constroem, felizes, seus castelos de areia, mesmo sabendo que as águas marinhas dentre em pouco os destruirá... Assim devemos ser nós, adultos: quais crianças devemos erigir projetos e sonhos, mesmo sabendo que não são eternos... E quando nossos planos e metas, nossa realidade conquistada tomar rumos outros que não havíamos previsto, cabe-nos lembrar que tudo pode recomeçar novamente, nunca é tarde demais... Há milagres milimétricos nas entrelinhas de cada instante, convidando a novos investimentos, novos devires, filha.
Ouvindo as palavras da mãe, a filha entrou no quarto, rasgou a foto do ex-namorado e entrou em um site de relacionamentos – de paquera, na verdade. Criou um perfil com o slogan: “Moça bonita, cheia de vida, quer amor verdadeiro”. No outro dia, ao abrir a correspondência, havia recebido propostas de cinco interessados. Eles pediam fotos e perguntavam pormenores de como ela era. Antes de enviar as fotos, cortou o cabelo bem curtinho - revolucionou-se. A respeito de si, disse: “eu não sou, mas estou sendo ‘assim e assado’... e estou aberta a mudar de idéia, porque aberta ao Mundo!”. Diante de moça tão decidida, os pretendentes aferravam-se em disputas audazes, por intuir que ela manobrava magistralmente uma fonte inesgotável de vida, cujo fim não podiam enxergar, sequer imaginar. - O tr(i)unfo da moçoila foi descobrir que a arte da vida é a arte de recomeçar, sempre! O sim: sua afinada tecnologia existencial!

Nenhum comentário:

Postar um comentário