Caiu. E, muito azarado, quebrou as patas. Uma vez quebradas e já não tendo a antiga e versátil utilidade, denominou-as pernas. Invejoso dos outros que se moviam de maneira organicamente natural e impotente de imitá-los, além de vítima mais fácil de predadores, inventou a prudência: produto indesejado de sua deficiência.
Enquanto os seus semelhantes gozavam de plena saúde, movendo-se em árvores e respirando como elas, ele, debilitado e lançado ao exercício involuntário da contemplação, passou a ter idéias. E, doente, via na árvore algo incompatível com seu ser; então, cortando a árvore, adaptou-a a seu debilitado estado: nasce a “idéia de cadeira”.
Ao vê-lo sentado alguns de seus semelhantes, indignados por ter-lhes cortado a árvore, foram se queixar. Envergonhado daquilo em que se tornara, e tentando evitar uma próxima queixa, desenvolveu estudos através dos quais conseguiu arquitetar uma caixa mais ou menos grande, que mais tarde denominou “casa”, para se esconder dos seus semelhantes: criminoso, pariu a geometria e a propriedade privada.
Ali confinado atraiu curiosos que deixaram-se persuadir pelas supostas vantagens da prudência e de seus posteriores produtos: da cadeira, da casa própria e da geometria. Estes curiosos, sem saber que tais invenções derivavam da patologia de um símio enrustido, tornam-se partidários inconscientes de uma espécie de “lepra espiritual”. Assim, decidiram voluntariamente trocar as patas por pernas e formaram um grupo que, com o passar dos tempos e devido à hereditariedade, proliferou nas gerações seguintes os seus métodos artificiais de subsistência que, posteriormente, denominaram (de) cultura.
A centésima quinta geração que os sucedeu já estava total e biologicamente incapacitada de uma saúde efetiva; epileticamente civilizados e impossibilitados de competir com os outros seres por alimentos, inventaram técnicas de cultivo compatíveis com a sua atrofia: surge a agricultura e a pecuária.
Déspotas orgulhosos de sua miopia molecular, “evoluíram” e proliferaram-se mais e mais através dos tempos... Bem vindos ao século XXI!
sábado, 1 de maio de 2010
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