Desprezo por todas as coisas derivadas do gênero humano, inclusive por ele próprio: esta é uma das definições mais passíveis de explicar meus sentimentos atuais.
Toda empresa construída, toda bandeira empunhada em nome de algum propósito, seja este qual for, remetem necessariamente seus partidários ou protagonistas à ignomínia da ação. Digo “ignomínia da ação” porque é justamente a ação humana que apodrece o mundo (os buracos na camada de ozônio, a extinção de diversos seres, o capitalismo, as guerras..., provam isto, absolutamente). Logo, todo aquele que prospera, insiste e produz neste mundo, está em conivência com a podridão que lhe é imanente. Assim, apenas o louco incurável, aquele que “não vive neste mundo” é portador de dignidade, é o único que merece ter a (in)consciência limpa e habitar o paraíso bíblico, caso ele exista. Em termos de virtude, o lunático é o Sócrates pós-moderno: um por ideal, outro por disfunção psíquica, ambos abandonaram este mundo em nome da Justiça.
A vida não tem cura. Construamos, em nome de um antídoto ideal, toda sorte de filosofias, doutrinas, códigos éticos e morais, igrejas e penitenciárias..., não chegaremos jamais a lugar algum: justiça e respiração são incompatíveis!
A superioridade do anarco-niilista em relação ao democrata, ao socialista/comunista, torna-se evidente quando se vê estampado no rosto desses últimos um otimismo insensato que, garantido pela canonização da apostila marxista, faz deste tipo uma espécie de herói institucionalizado, cuja fé numa revolução redentora - fé tão inquebrantável quanto estúpida - só pode ser produto de sua ingenuidade ou fraqueza... Já a amargura pontual do anarquista/niilista é sinal da coerência com que este lê o mundo: demasiado conhecedor da natureza humana e familiarizado com o Inevitável, está a um passo do asceta - uma vez que a era moderna o impossibilita de atingir a saúde dos cínicos. Ele captou a nulidade de todo gesto, de todo substantivo e de todo empreendimento. Seu sarcasmo redentor funciona como uma ferramenta que permite que ele continue respirando.
Ainda sem nos desprendermos de tipos interessantes, voltemos nossos olhos ao misantropo. Estando em harmonia com seus instintos ele vê o ser social como uma espécie de eunuco: castrado e submisso. O misantropo verdadeiro não consegue dissimular seu asco em relação ao conjunto social e a todo aquele que se acredita cidadão - no sentido pleno da palavra-, só deixando de sentir nojo quando ele passa a proporcioná-lo: conheço um que, embora se dissimule bem, adora vomitar em público, fazer gestos repulsivos e, sempre que possível, dizer coisas desagradáveis. A misantropia, certamente, advém da - ou implica a - não subordinação aos costumes, padrões e códigos éticos. Portanto: só é concebível em indivíduos não adestrados/adestráveis...
sábado, 1 de maio de 2010
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